Da trilogia: Por que as feministas são tão chatas?
O último texto – que pode ser lido aqui – terminou trantando de cultura.
E falando em cultura, as
feministas também vieram com essa de “cultura do estupro”. Desculpa
esfarrapada, na opinião de muitos, pois é difícil para muitas cabeças masculinas
compreenderem que todos os nossos valores estão associados à cultura e que esse
termo só foi criado para enfatizar a ligação que existe entre os valores de
nossa cultura e o acontecimento de estupros.
Vejam bem, o Brasil, como
sabem as pessoas que estudaram História na escola, foi colonizado pela escória
de Portugal. Todos que não queriam lá foram enviados para cá, prisioneiros,
prostitutas, etc. Pessoas sem educação, sem estudo, sem valores. Eles povoaram
nosso país e espalharam por ele suas ideologias retrógradas. É fácil perceber
que em um mundo de bandidos e prostitutas (generalizando ao extremo), o estupro
não será visto da mesma forma que em uma sociedade bem educada de pessoas que
respeitam os direitos umas das outras.
Além disso, não é que ao pé da
letra nossa cultura diga “Estuprem, não tem problema!”, mas as pequenas
indiretas que ela joga em plena televisão aberta para qualquer criança ver dão
isso a entender. Os comerciais de cerveja são um ótimo exemplo. É difícil ver
um que seja dirigido ao público feminino, porque mulheres são “delicadas demais
para beber, não pode”. Contudo, pode aparecer semi-nua no comercial para
promover uma ideia que diz “Beba, e você vai ter uma mulher tão bonita quanto
essa da propaganda”. Então o homem bebe, perde parte da consciência, pode estar
fissurado com a ideia, que foi sutilmente absorvida por seu subconsciente sem
que ele percebesse, vê uma mulher bonita e logo faz a associação. Mas na
propaganda ela quis, algo está errado, ela quer sim, só está se fazendo de difícil.
Estupro. “A culpa foi dela, que estava em um bar (lugar de homem) àquela hora
da noite, em vez de estar em casa assistindo novela”.
Casos menos extremos ocorrem frequentemente em
festas, tendo inúmeras mulheres próximas a mim já sofrido, ou quase sofrido,
por causa disso. É quase a mesma coisa, o homem bebe, está exaltado, vê uma
mulher bonita e acha que ela tem a obrigação de ficar com ele. Como é mais
forte, abusa disso e a segura. Se a menina não for corajosa o suficiente para
se defender, ou não estiver com alguém por perto para ajudá-la, ela será
forçada a fazer algo que não queria. Porque estava usando uma roupa curta,
muita maquiagem, estava se insinuando, estava pedindo.
Quem acha que o feminismo é inútil, conversa de
mulher que "gosta de se fazer de vítima", não merece atenção; não
vale a pena argumentar com gente que não se compadece com a situação de milhões
de mulheres impossibilitadas de tudo só por serem mulheres. Quem acha que as
feministas são chatas e não tem razão para lutar talvez não saiba que na China
ainda hoje se abortam meninas, porque são meninas. Talvez não veja moças sendo
assediadas na rua por causa de suas roupas. E sabe o que mais? Talvez nem tenham culpa.
Crescemos com a ideologia machista sendo afixada em
nossas mentes, por isso, a maioria das mulheres só se torna feminista quando é
mais velha, porque é só nessa idade que ela percebe o que está acontecendo. E
isso também acontece com os homens, mas como, ao crescer, eles não percebem
nenhuma diferença no tratamento que recebem, têm dificuldade em olhar para o
próximo. Muitos não têm empatia suficiente para se colocar no lugar das
mulheres que sofrem abusos de seus maridos, colegas de trabalho, estranhos,
então viram a cara e fingem que nada está acontecendo.
Mas aí chegam as feministas chatas e os obrigam a
olhar para tudo isso e, nesse momento, não dá mais para ignorar, o jeito é
menosprezar abertamente, dizer que é exagero, caluniar o movimento e denigrir
sua credibilidade. Pode ser uma tentativa de se sentir melhor; muitas pessoas
têm dificuldade de admitir culpa, não gostam de errar. Por isso, é melhor dizer
que feminista é mulher desocupada, que não tem louça para lavar, que não tem
homem para cuidar, apelar para termos de baixo calão e, enfim, pregar o
machismo em toda a sua glória. Pronto, trabalho feito, agora elas devem ficar caladas.
Porém elas
não ficam. Essas chatas! Para os
homens, é claro, é mais difícil entender o que as mulheres passam, porque
nenhum estranho nunca passou a mão na bunda deles quando estavam no ônibus,
porque ninguém falou mal deles pela roupa que usou, ou pelo comportamento
"indiscreto" que teve. Afinal, homens podem falar abertamente de
sexo, masturbação e coisas do tipo, enquanto as mulheres precisam fingir, para
os outros e para si mesmas, muitas vezes, que não sabem o que é isso, que não
sentem vontade, que não fazem, porque não podem, é feio. Então, as feministas
começam a falar sobre isso e, que escândalo, também começam a usar palavrões. Escândalo!
Mulher não pode falar palavrão! Por quê? Porque tem que ser delicada, porque é
o sexo "frágil", e palavras fortes são o oposto da fragilidade.
Fico muito triste ao ler
comentários de homens que dizem que feministas precisam calar a boca, não têm
cérebro, etc, pois até parece que eles não têm mães. E pior ainda se tem e elas
são de tal modo alienadas a ponto de pensar que não possuem poder nenhum para
se defenderem das desigualdades que sofrem, a ponto de se calarem e se
conformarem com os pensamentos quase misógenos de seus filhos. Penso mais uma
vez naquele dado, ultimamente tão divulgado, de que uma cada cinco mulheres será estuprada. Penso nesses homens que as
culpam. E se fossem suas mães? Será
que as culpariam? Ou suas irmãs, amigas, namoradas, primas. Tenho medo de
homens assim. São eles que, sem perceber, contribuem para que a cultura do
estupro continue em vigor, porque ao dizer que é “drama” e “invenção”, eles
ajudam a ocultar esses acontecimentos hediondos. Tratando-os como ridículos,
fazem com que crimes percam a seriedade e agressores continuem impunes. Por
quê? Porque as feministas são chatas.
Na verdade, elas são tão
chatas, que muitas se tornam feministas só de teimosia, porque sofreram com o
machismo e resolveram se vingar. Muitos homens rebatem os argumentos feministas
com a questão da Lei Maria da Penha (que, para quem não sabe, é tanto para
homens quanto para mulheres, mas devido à cultura machista em vigor, que
estabelece o homem como o “provedor”, o “forte”, poucos homens têm coragem de se expor à proteção dessa lei, com
medo de perder sua masculinidade) e as delegacias exclusivas para a mulher.
Acho que eles não sabem que a maioria das mulheres não é levada a sério pelos
policiais quando vai dar queixa, ou que – apesar de isso já estar mudando –
essa lei, assim como a maioria das outras em nosso país é falha e é
desobedecida. É preciso de muita coragem e um bom advogado para acionar a
justiça em seu favor, porque as feministas são tão chatas, as mulheres são tão
dramáticas, que é difícil acreditarem em seus relatos.
Esses homens, que reclamam que as mulheres já são protegidas demais pela lei, deveriam saber que, apesar
de todos esses “privilégios” (que certamente não existiriam se não fossem
necessários, pois a criação de uma lei que não possui aplicação é algo impensável),
68% das vítimas de violência doméstica não denunciam seus agressores.
Por medo. Sendo assim, em seus próprios lares, que deveriam ser sinônimos de
acolhimento e aconchego, sofrem, sentem desconforto, mas porque a sociedade não
as leva a sério, não têm coragem de lutar para mudar a situação.
Amar é respeitar e tratar o
outro como seu igual. A sociedade precisa parar de fingir que é “natural” ou
“aceitável” um homem violentar sua mulher porque ela “se comportou mal”. Na
verdade, não se deve sequer criar justificativas para isso. A violência
doméstica é uma realidade. A cultura do estupro é uma realidade. A tentativa de
justificar os atos das pessoas que cometem tais crimes é uma realidade.
Precisamos, agora, enfrentá-las. Precisamos abrir os olhos.
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